Jardins, vinhas e mouros no trobar satírico galego-português

No discurso das cantigas de amor e de amigo, e mesmo nas cantigas marianas galego-portuguesas, produzidas entre os séculos XII e XIV na Península Ibérica, a imagem do jardim e seu variado campo semântico resultam previsíveis, uma vez que o tópico do locus amoenus é comum nesse tipo de poesia. Nas cantigas satíricas, no entanto, aquele espaço, onde plantas ornamentais ou nutritivas vicejam em versos jocosos, críticos e obscenos, adquire sentidos que merecem atenção. A partir de uma abordagem que leva em conta a tópica literária e a história social, este trabalho investiga as menções ao jardim e suas implicações nas cantigas satíricas de Pero Gomez Barroso, Roi Gomez de Briteiros e Estevam da Guarda, e procura demonstrar que a análise desses elementos desfaz, por um lado, uma das expectativas que eventualmente se poderia ter de sua leitura: de que os aspectos do locus amoenus amoroso passariam pelo tratamento da paródia, e aponta, por outro lado, que os detalhes paisagísticos revelam em sua literalidade ou em seu nível documental, marcas cotidianas voltadas para a habitação e a agricultura, mas funcionam, sobretudo, como imagens cujo significado aflora de modo burlesco e obsceno.

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