A bandeira sueva do Reino da Gallaecia revista

Em datas recentes uma reconstrução da bandeira sueva do reino da Gallaecia teve certo sucesso, no que se refere à sua difusão. A juízo do autor deste trabalho a bandeira que se tem difundido contém erros devidos a uma transcrição parcial e deficiente da fonte. Com base no relatório original, e atendendo a critérios históricos e antropológicos, este artigo propõe uma outra interpretação que recolhe contextualmente tanto os dados descritivos
do documento como uma visão reintegradora no quadro específico da cultura tradicional galaica.
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Jardins, vinhas e mouros no trobar satírico galego-português

No discurso das cantigas de amor e de amigo, e mesmo nas cantigas marianas galego-portuguesas, produzidas entre os séculos XII e XIV na Península Ibérica, a imagem do jardim e seu variado campo semântico resultam previsíveis, uma vez que o tópico do locus amoenus é comum nesse tipo de poesia. Nas cantigas satíricas, no entanto, aquele espaço, onde plantas ornamentais ou nutritivas vicejam em versos jocosos, críticos e obscenos, adquire sentidos que merecem atenção. A partir de uma abordagem que leva em conta a tópica literária e a história social, este trabalho investiga as menções ao jardim e suas implicações nas cantigas satíricas de Pero Gomez Barroso, Roi Gomez de Briteiros e Estevam da Guarda, e procura demonstrar que a análise desses elementos desfaz, por um lado, uma das expectativas que eventualmente se poderia ter de sua leitura: de que os aspectos do locus amoenus amoroso passariam pelo tratamento da paródia, e aponta, por outro lado, que os detalhes paisagísticos revelam em sua literalidade ou em seu nível documental, marcas cotidianas voltadas para a habitação e a agricultura, mas funcionam, sobretudo, como imagens cujo significado aflora de modo burlesco e obsceno.

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Autoria Feminina na revista portuguesa Presença, folha de Arte e Crítica (1927-1940)

 

A revista Presença, folha de Arte e Crítica (1927-1940) foi pela sua ideologia, papel de divulgação, defesa da literatura e cariz modernista, um documento particular dentro das publicações periódicas portuguesas. Neste artigo pretendemos, em primeiro lugar, aclarar a participação de mulheres nos 56 números da revista Presença, dando visibilidade a estas artistas, criadoras e escritoras e, em segundo lugar, contribuir para a valorização da sua obra no panorama Cultural e Literário Português.

Assim, examinaremos o que foi a efetiva colaboração artística destas criadoras na revista, partindo depois para a análise e comentário da obra de autoria feminina na Presença.

Procuramos pois contribuir, e pensamos que pela primeira vez, para uma aproximação de estudos de género na Presença, dando visibilidade a um grupo de mulheres que colaborou, a partir do ano de 1928, numa revista de arte e de crítica, exclusivamente dirigida por vozes masculinas, e que pela via artística e literária, em nossa opinião, contribuiu para a dignificação da condição feminina portuguesa no século XX.

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Regionalismo e Modernismo no Brasil: diálogos entre velhas pragas e modernos localismos

Percorrendo algumas obras do Romantismo, do regionalismo dito “pré-modernista” e do Modernismo brasileiros, este ensaio se detém sobre as forças presentes nos debates intelectuais da virada do século XIX ao início do século XX, objetivando demonstrar como parte dos argumentos utilizados tanto pelos artistas, quanto pela crítica obliterou clivagens relevantes para a compreensão das tensões oriundas dos processos de modernização em curso. Se por um lado, o Modernismo de 1922 pode ter sido responsável por rupturas importantes no que tange a certa liberdade criativa, com seus procedimentos destrutivos, conforme apontam diversos autores, por outro, certamente não poupou a geração imediatamente anterior à sua, desferindo críticas ferrenhas que, a bem da verdade, nem sempre se sustentavam. Para além disso, muitos de seus posicionamentos fizeram escola nos discursos críticos posteriores e consolidaram maneiras de apreender, não raramente de modo apriorístico, a literatura dita regional ou regionalista. Discutimos, então, como tivemos, no Brasil, arte moderna antes de chegarmos ao Modernismo, muito embora frequentemente este viés seja ignorado.

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Baudelaire em Murilo

Murilo Mendes transformou a obra poética e crítica de Baudelaire num ponto de referência para a sua própria obra. Neste trabalho, apresenta-se um percurso analítico da presença de Baudelaire na obra de Murilo Mendes. São analisados textos até agora esquecidos em periódicos da década de 1930, textos críticos e textos poéticos escritos por Murilo em português, italiano e francês. Dessa análise decorre a constatação de que Baudelaire sustinha o conceito muriliano de modernidade artística, um conceito obviamente fundador num poeta tão significativo da poesia moderna brasileira.

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A linhagem de Nabuco

Partindo da premissa de que a viagem à Europa, enquanto etapa necessária à formação intelectual, esteve diretamente associada a práticas de deslocamento entre escritores brasileiros na virada do século XIX para o XX, buscou-se averiguar como isso se dava em obras de autores do período nas quais a experiência viajante e sua escrita mostraram-se importantes. Nesse sentido, a análise da narrativa de Joaquim Nabuco em Minha Formação (1900) permitiu estabelecer um quadro de referências, visto que o escritor e político, ao assumir a cultura europeia como universal, representava exemplarmente a condição ambígua do intelectual sul-americano condenado ao exílio decorrente de seu duplo pertencimento: a América e a Europa. Em títulos de escritores como Gilberto Amado, João do Rio e Olavo Bilac, à maneira de Nabuco, observou-se que a viagem, fundamentalmente literária, encontrava na cultura letrada seu ponto de partida e chegada assim como funcionava como fator distintivo de uma elite intelectual. O estudo dos textos desses autores bem como da produção crítica e teórica a respeito do assunto possibilitou concluir que o percurso de letras derivado de uma matriz europeia caracterizou-se pelo movimento de verificação, para usar termo empregado por Gilberto Amado. Verificar, enquanto confirmação do já sabido, denotava o caráter conservador de uma viagem dirigida à manutenção da cultura europeia como modelo e, consequentemente, do privilégio de grupos sociais que se distinguem, entre outras coisas, pela formação letrada.

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Formas de autorrepresentação e mutações contemporâneas da literacia. Construir um bilhete de identidade personalizado

Desde 2008/ 2009 tenho lecionado a disciplina de licenciatura Autobiografia e Histórias de Vida no âmbito da qual pedi aos alunos que elaborassem um bilhete de identidade personalizado. Com este material pude desenvolver uma reflexão a partir do diálogo entre a forma por excelência de identificação pública em Portugal e o discurso identitário de jovens estudantes universitários. O processamento textual dos seus bilhetes de identidade revelou a estreita ligação com os suportes mediáticos que os enformam (na esmagadora maioria digitais) e com as práticas de literacia a eles associadas. Afinal de contas, estes estudantes vivem imersos num contexto de revolução digital em que as noções estabelecidas de literacia e os modos tradicionais de leitura e autorrepresentação estão a ser desafiados e até postos em causa

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Poesia, Corpo da Potência. Poética e potência a partir de Anselm Kiefer e António Madureira Rodrigues

Partindo de alguns quadros e reflexões do pintor e escultor alemão Anselm Kiefer e de poemas do poeta português António Madureira Rodrigues, o presente ensaio procura refletir sobre o lugar da potência e da contingência na atividade artística contemporânea, tomando como principal ponto de convergência o corpo enquanto espaço-limite de associação entre palavra e processo criativo.

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Crítica de arte e democracia: diálogo com Howard Becker

Neste artigo abordamos as tensões políticas que permeiam a teorização contemporânea da função mediadora da crítica de arte, que se encontra hoje cindida entre o diálogo democratizante com o público empírico e a formação do público futuro – numa tensão cujo viés pedagógico tem persistido desde o romantismo. Definimos tal dicotomia como um conflito valorativo na avaliação das produções merecedoras de inclusão no debate artístico. A partir de um diálogo com o sociólogo norte-americano Howard Becker, analisamos o caráter compulsório da inscrição insti tucional da crítica, o que mitiga as suas pretensões à universalidade, à objetividade e, acima de tudo, ao distancimento da atualidade calcado na confiança em seus próprios valores. Após situarmos as proposições de Becker em meio ao amplo movimento de releitura política da tradição estética ocorrido após 1968, defendemos a democratização do campo artístico como a referência político-normativa ideal para o debate artístico atual. Isso leva à proposição de que a dicotomia valorativa que hoje tensiona a crítica de arte pode ser destravada mediante o reconhecimento da finitude da crítica: na condição de construção operada por um observador pertencente a um sistema intelectual específico, a sua objetividade se mostra uma versão plausível de uma realidade inter-subjetiva, construída numa interlocução intra-institucional com o exterior da própria instituição, com consequências para a sua relação com a produção de conhecimento. Analisamos, por fim, como o reconhecimento desta condição livra a crítica da polarização político-valorativa ao reformular a sua relação com o universo dos objetos.

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No meio do caminho havia cadernos: oralidade, língua e literatura na Guiné-Bissau e em Moçambique

 

A partir da tensão entre a língua portuguesa, a oralidade e as línguas nacionais africanas, como as de Moçambique e da Guiné-Bissau, este texto aborda os muitos conflitos oriundos da dominação colonial que resultam na escolha de escritores sobre em qual delas escrever literariamente. Assim, pretende refletir sobre as hierarquias, formas de dominação e de resistência no panorama das literaturas destes países, levando em consideração movimentos culturais como “Negritude”, associados ao colonialismo e ao pós-colonialismo na discursividade sobre literatura e nação. É nossa intenção demonstrar como a escrita literária revela a atmosfera de incompletude do romance como gênero literário e a representação das diferenças expressas pelas múltiplas realidades retratadas pela literatura.

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